CARTA COMPROMISSO
PARA CANDIDATURAS À PREFEITURA E VEREANÇA
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO
Nós, Mães, mulheres, profissionais da Assistência ao Parto e sociedade civil em geral, viemos a público expressar nosso posicionamento a respeito da urgente e necessária mobilização para o combate à Violência Obstétrica em todo o território nacional.
No contexto das eleições municipais, em que as candidaturas para Prefeituras e Vereanças pelo Brasil, apresentam propostas para as mais diversas questões, não podem deixar de considerar em seus projetos políticos, efetivo enfrentamento ao cenário de Violência Obstétrica existente em suas cidades.
O Brasil é signatário da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher - Convenção de Belém do Pará (09 de Junho de 1994) refletido no Decreto Lei 1.973/96, em que se define como violência contra a mulher "qualquer ato ou conduta baseada no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto na esfera pública como na esfera privada", o que nos faz exigir que em nenhuma esfera a mulher brasileira sofra violações de direitos.
As tipificações estabelecidas na Convenção de Belém do Pará, não estão apartadas das violações presentes no ciclo da Gestação, Parto e Puerpério.
Ainda que não tenhamos mecanismos em nossa legislação que coíbam tais
violações, se faz absolutamente urgente que representantes da política institucional se comprometam com essa pauta e publicamente assumam compromisso para a criação de legislações em suas cidades para este enfrentamento.
Faz-se essencial apresentar que a luta organizada das mulheres para acesso aos seus direitos no ciclo gravídico puerperal, ocorre há muitos anos, e como resultado podemos destacar:
Em 17 de Outubro de 1993, na cidade de Campinas, a REHUNA ( Rede pela Humanização do Parto e Nascimento) publicou uma carta-manifesto para debater as condições de assistência oferecidas à mulheres em seus ciclos gravídicos-puerperais e desde então proliferam as redes, simpósios e congressos que se estabelecem para esta finalidade, onde destaca-se o SIAPARTO (Simpósio Internacional de Assistência ao Parto) onde diversos coletivos, profissionais da obstetrícia, estudantes, entidades e sociedade civil, se organizam para ampliar conhecimentos científicos e contribuir para a mudança do cenário da Assistência ao Parto no Brasil.
O debate sobre o enfrentamento à violência obstétrica no Brasil ganha a cada dia, maior adesão e engajamento da sociedade civil, que demanda contundente atuação da política institucional.
DADOS & INFORMAÇÕES
São inúmeros os estudos acadêmicos e científicos que denunciam o cenário alarmante de violências obstétricas e neonatais sofridas por mulheres e bebês, e o quanto elas se ampliam quando considerado o recorte racial.
Para esta afirmação, destacamos a pesquisa "A cor da dor: iniquidades raciais na atenção pré-natal e ao parto no Brasil - 2017 e Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado - 2010, que aponta: 1 em cada 4 mulheres já se perceberam vítimas de violência obstétrica.
O recorte racial da pesquisa revela que mulheres pretas lideram os índices de negligenciamento e falta de acesso à assistência obstétrica adequada.
Mulheres pretas se comparadas às mulheres brancas têm:
62% a mais de chances de terem um pré-natal inadequado;
49% a mais de chances de não receberem analgesia em trabalho de parto;
33% a mais de peregrinação em maternidades para serem acolhidas em trabalho de parto;
67% a mais de chances de terem o direito do acompanhante negado, mesmo com a existência de Legislação Federal para essa garantia (11.108/2005).
RELATOS DE CASOS
Ressaltamos também outro exemplo emblemático de violência obstétrica sofrido por Adelir Goes, em 2014. Onde no site El País se lê:
“Na madrugada de 1o de abril, dois poderes, a Medicina e a Justiça, produziram uma cena histórica no Brasil. Nela, uma mulher em trabalho de parto, Adelir Lemos de Goes, 29 anos, foi arrancada de sua casa, na zona rural do município gaúcho de Torres, por um oficial de justiça e policiais armados. Em seguida, ela foi obrigada a entrar numa ambulância. Se não entrasse, prenderiam seu marido, Emerson Guimarães, 41 anos, técnico em manutenção industrial. Apavorada, com contrações a cada cinco minutos, preocupada com o susto dos filhos pequenos, Adelir foi escoltada até o Hospital Nossa Senhora dos Navegantes. Lá, mais uma vez, foi obrigada por ordem judicial a deixar-se cortar. Contra a sua vontade, tiraram do seu
útero, por cesariana, seu terceiro filho, uma menina. Naquela madrugada, Adelir descobriu que dois espaços que considerava privados, invioláveis, tinham sido invadidos no meio da noite: sua casa, seu corpo.”
Ambos relatos demonstram que o Brasil, para além de não providenciar legislações de combate à violência obstétrica, comete constantes violações de direitos das mulheres, também em seus ciclos gravídicos-puerperais.
Em países da América Latina, como Argentina (2009) e Venezuela (2017) foram criadas legislações para combate à violência obstétrica, que reconhecem este problema como social, político e público, e responderam à cobrança realizada pelo movimento de mulheres de seus países.
Como triste exemplo da realidade, ressaltamos o Trajédia Alyne Pimentel foi vítima, publicado no site do Ministério Publico de São Paulol, onde se lê:
“O caso Alyne Pimentel é o mais emblemático quanto à violação ao direito a um parto saudável e pleno acesso à saúde. Aline, em 14 de novembro de 2002, com apenas 28 anos de idade, e 6 meses de gestação, buscou atendimento médico na rede pública de saúde de Belford Roxo (RJ). Apesar de apresentar um quadro de fortes dores ela foi liberada após administração de analgésicos. Sem melhora, retornou ao hospital, onde se constatou a
morte do bebê. Submetida, após horas de espera, a uma cirurgia para a retirada placenta, o quadro se agravou e ela precisou ser transferida para um hospital em Nova Iguaçu, operação realizada, com grande demora e com omissão dos profissionais e do sistema brasileiro de saúde. No corredor deste hospital, devido à falta de atendimento médico adequado, Alyne faleceu em decorrência de hemorragia digestiva. O caso foi levado ao conhecimento do Comitê CEDAW da ONU em 2011, e o Brasil foi condenado ao pagamento de indenização por negligência no serviço público de saúde. Foi a primeira condenação internacional do Brasil em razão de morte materna.”
COMPROMISSO
Em base do exposto, orientadas e orientados por estudos científicos, publicações acadêmicas, pesquisas e matérias jornalísticas relacionadas ao final deste texto, pedimos a adesão das candidaturas, se comprometendo na articulação popular e institucional para criação de mecanismos legais e efetivos para o combate da violência obstétrica bem como total proteção e fortalecimento do SUS no âmbito de sua municipalidade.
As candidaturas se comprometem a realizar em seus possíveis mandatos as
ações a seguir:
1- Articular com coletivos de mulheres, coletivos de mães, Doulas, Obstetrizes, Obstetras que atuem na assistência ao parto seguro, respeitoso e baseado em evidências científicas, a criação e apresentação de projeto de lei para combate à violência obstétrica e neonatal em sua cidade.
2- Articular institucionalmente reserva orçamentária para criação de programas de formação territoriais de mulheres para que sejam multiplicadoras locais sobre o que é violência obstétrica e neonatal, e como combatê-la
3- Articular com representantes populares e institucionais, a criação de programas educacionais para elaboração de formação continuada de profissionais de saúde sobre combate à violência obstétrica e neonatal nos âmbitos da saúde pública, com
orientação interseccional e antirracista, através de eixos que discutam Racismo estrutural e institucional e como combatê-los.
4- Articular com representantes populares e institucionais o fortalecimento da estratégia saúde da família.Articular com representantes populares e institucionais atuações de fortalecimento do SUS e melhoria das Unidades básicas de saúde locais, garantindo pré natal e pós parto de qualidade, atendimento pediátrico e suporte à amamentação qualificados, conforme preconizados pela OMS.
5- Articular institucionalmente reserva orçamentária para a viabilidade das ações de combate à violência obstétrica e neonatal.
REFERÊNCIAS
A Violência Obstétrica existe. Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher e Associação Artemis. Disponível em: https://www.defensoria.sp.def.br/dpesp/repositorio/41/FOLDER_VIOLENCIA_OBSTETRICA.PDFBRASIL,
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